Hip Hop e suas gerações
Hip Hop e suas gerações

A Responsabilidade do Hip-Hop e Suas Gerações

Analisando a situação atual do Rap no Brasil, reparei que os famosos grupos sempre se tornam falados, devido a brigas, batalhas (que se tornam totalmente pessoais), respostas de raps, etc.
Um mar sem fim de discussões sobre “Quem Estava Lá”, quem é mais original, quem é mais antigo, quem é melhor, quem tem mais dinheiro… E o objetivo do rap se perde em discursos egocêntricos e totalmente sem fundamento.

Primeiro ponto que quero colocar aqui é que, o objetivo inicial do Hip-Hop foi sobre diversão!

Desde as festas criadas pelo DJ Kool Herc. (Porque as festas disco eram criteriosas quanto a vestimentas, status, dança, – Se algum B-Boy começasse a dançar era expulso- e claro, o tipo de música) Então, Herc começou as festas porque ele queria algo para toda juventude sem excluir ninguém, queria o gueto unido, queria algo que pudesse escapar da rotina dura do Bronx – que na época estava em guerra- , fugir do stress, da pobreza, do desemprego, segundo ele, no livro “Can’t Stop, Won’t stop” parafraseando

“As festas que eu dei deram resultado. Elas se tornaram um rito de passagem para os jovens no Bronx. Então, a geração mais jovem entrou e começou a colocar sua rotação sobre o que eu tinha começado.”

PARK JAM BRONX 1970,s
PARK JAM BRONX 1970,s
Oque eu quero que vocês entendam primeiramente é… O Hip-Hop sempre foi sobre diversão sim!

Porém é muito mais sobre política social, porque foram essas forças que o forçaram a se tornar uma cultura. Através disso, eu pergunto a vocês, o que realmente é necessário ser dito? O Hip-Hop é um instrumento de fala, é sobre ser quem você realmente é, algo que uni a todos, jovens e velhos, não é sobre eu ser melhor do que você ou você ser melhor do que eu, é sobre eu e você, conectados um a um, e é por isso que tem um apelo mundial. O Hip-Hop tem dado aos jovens um meio de entender o seu mundo, sendo eles do subúrbio, ou da cidade, ou seja lá onde for.

Segundo o Herc, ainda no livro “Can’t stop, won’t stop” ele diz

“O Hip-Hop também criou muitos trabalhos, que ao contrário não existiriam. Mas ainda mais importante que isso, eu penso que o Hip-Hop criou uma ponte entre uma lacuna cultural. Trouxe crianças brancas juntas com crianças negras, onde eles tem algo que amam em comum. Isso ultrapassa qualquer estereotipo e pessoas odiando umas as outras por isso.”

E ele continua “O Hip-Hop é a voz dessa geração. Mesmo se você não cresceu no Bronx nos anos 70, ele estará lá para você. O Hip-Hop tem se tornado uma força poderosa, onde vincula todas as pessoas, todas as nacionalidades, o mundo inteiro junto”.

À partir disso quero fazer um questionamento, claro,  junto com o Herc que concorda comigo. Vejam bem, não sou contra o uso do Hip-Hop como uma forma de ganhar dinheiro, pois todos os elementos são compostos por artistas, e eles merecem o devido reconhecimento, a questão em si é:

Será que a geração do Hip-Hop está fazendo o uso correto desse instrumento e reconhece a posição de poder que eles estão? Herc diz:

“Vocês percebem o quão poderoso o Hip-Hop é?”

Muitas pessoas estão fazendo algo positivo, que estão fazendo do Hip-Hop o que ele deveria ser, atingindo jovens, mostrando à eles que o mundo pode ser sobre viver juntos e ter diversão, mas muitas vezes, os que são mais reconhecidos são os que estão enfatizando o negativo, e também acho que muitas pessoas tem medo de falar sobre algumas questões. Herc foi muito sábio em dizer: “Keeping it Real” tem se tornado mais uma palavra da moda, soa bonitinho, mas tem sido uma frase gananciosa e perversa. “Não é sobre se manter real, tem que ser sobre manter isso certo”.

Por exemplo, muitos rappers querem ser tão “Bling Bling”, se aparecer dizendo que são melhores, que estão na cena a muitos anos, que são isso e aquilo, perdem tempo falando de coisas que saem fora da realidade de quem ouve. Mas pô, será que eles não tem outras questões? Quais são as coisas que realmente tocam você? Eu acho que é sobre isso que o povo quer ouvir. Rappers começando a dialogar com as pessoas, falando sobre coisas que acontecem na vida real, sobre questões que ninguém tem coragem de falar. Herc lindamente diz:

“Música as vezes é remédio, e não há rappers suficientes tomando vantagem de usar o Hip-Hop como um modo de lidar com sérias questões, como uma maneira de tentar mudar as coisas antes que a tragédia venha” (essa parte ele se refere a Biggie e Tupac, como as gangues usaram isso a favor deles, usando figuras publicas e famosas pra mostrar quem manda, com a midia manipulando tudo, sendo que nem brigados eles eram antes de tudo, e também como as pessoas só se tocaram depois da tragedia, que havia algo de errado nessa história toda).”

Entenderam o porque o Hip-Hop é tão poderoso?

O ponto que quero chegar é:

Quando os rappers vão aceitar que são um papel modelo na sociedade? Que se eles sairem na rua sem calça, amanhã milhares de jovens saírão sem calça também? Que os rappers (e todos os elementos dentro do Hip-Hop) tem que ter responsabilidade sobre aquilo que dizem? Vocês não podem dizer que não querem ser modelos de pessoas, porque vocês já tem atenção de jovens e adolescentes do mundo inteiro! E todos os elementos do Hip-Hop tem que aceitar que fazem parte do crescimento de uma geração.

Para finalizar, vou dar um exemplo bem claro de um grupo que não enxerga esse poder e usa o Hip-Hop erroneamente.

vou citar algumas partes das letras pra vocês entenderem que isso tudo que estou dizendo aqui é real:

  • “Não sou de favela, sou branco e nasci disposto”
  • “Aqui se corta o Axé”
  • “Não vivo de CLT”
  • “To cansado de ver ou ouvir iludidão falar sobre minoria”

Essas frases foram tiradas de músicas do Haikaiss, eu não vou entrar em questão da qualidade do som ou se eu gosto ou não, porque isso é irrelevante, quero focar nessas letras… Pare, e analise!

Preciso dizer algo mais? SIM, PRECISO!

DJ KOOL HERC, um dos criadores disso TUDO termina a introdução do livro “Can’t Stop, Won’t stop” dando um tapa nesses caras que não tem noção do que disseram e que vai contra TUDO que os principais fundadores do Hip-Hop lutaram… E é com isso que quero terminar esse meu primeiro texto, deixando vocês refletirem:

 “O Hip-Hop sempre tem sido sobre ter diversão, mas também é sobre tomar responsabilidade. E agora temos uma plataforma para falar sobre nossas ideias. Milhões de pessoas estão assistindo a gente. Diga para as pessoas o que elas precisam ouvir. Como você pode ajudar a comunidade? O que nós representamos?

O que aconteceria se a geração do Hip-Hop votasse, ou formasse organizações para mudar as coisas? Isso seria poderoso. Hip-Hop é familia, então todos tem que colaborar, norte, sul, leste, oeste, nós viemos de um lado, e esse lado é  a África. Essa cultura cresceu no gueto. E não importa, os mais marginalizados nascem para morrer. E todos estão sobrevivendo agora, e se nós temos um problema, temos que corrigi-lo, não podemos ser hipócritas. Isso é o que é o que eu espero que essa geração do Hip-Hop faça, para levar a todos nós ao próximo level e sempre nos lembrar: Hip-Hop não é sobre se manter real, é sobre manter-se certo”.

Sobre Gabriela Sobreira

Gabriela, 25 anos, zona leste de berço, criada no punk ao rap, artesã, feminista, viciada em livros, música e tênis.
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