Street Rhymes Stories : O Cangaço Feminino

“Sou o ôco do mundo, tenho três irmãs.

Uma sou eu, a outra é parecida comigo, e a outra sou eu mesma…”

Maria das Dores, mais conhecida como Inacinha.

Cangaço Feminino

Vocês conhecem nossas heroínas brasileiras?

Todos sabem que o movimento do Cangaço, teve como destaque Lampião e posteriormente Maria Bonita, como os principais lideres da revolução passada na década de 30, no sertão brasileiro.

Uma evidente luta de classes, que com a proliferação da oligarquia vigente, fez com que o banditismo se tornasse uma necessidade para a sobrevivência cotidiana.

Para entender o Cangaço é preciso se lembrar do coronelismo, que existia desde os tempos coloniais e teve seu papel durante a República Velha. Os “jagunços” estão inseridos nesse contexto, seja de revolta contra os coronéis e seus desmandos, mas muitas vezes como mão armada deles, que protegiam determinados grupos de cangaceiros, davam armas e definiam áreas, normalmente de inimigos políticos, em que eles podiam agir.
Mas o que os livros de história, nunca enfatizaram em seus conteúdos, foi que em meados de 1929, o Cangaço abriu as portas para a entrada de guerrilheiras, o que de fato foi um empoderamento feminino gigantesco para a época, visto que o pensamento predominante do sertanejo, era totalmente a favor do patriarcado, e da domesticação feminina, dominado por conceitos religiosos, que anulavam a figura da mulher como um todo.
Após a introdução do Cangacerismo na Bahia, Lampião conheceu Maria Bonita, e através de seus trabalhos manuais realizados em  lenços bordados, estabeleceram o primeiro contato visual, o que gerou uma empatia instantânea para ambos, a partir desse dia uma sequência de fatos culminaram para que esse relacionamento se tornasse uma parte muito significante de toda esta trajetória.

Com a descoberta deste relacionamento pelas autoridades repressoras da época, mais especificamente falando da instituição policial, sua familia começou a receber inúmeras ameaças de morte, o que fez com que seu pai se amedrontasse e fugisse para Alagoas, levando seus irmãos e sua mãe, pois Maria Bonita acreditou valentemente na força do amor que pairava sobre a luta que estava prestes a enfrentar, e decidiu ficar na Bahia ao lado de seu fiel companheiro, e este foi o marco inicial para a entrada das mulheres no bando.

Cangaço Feminino

A entrada das mulheres para o Cangaço, ocorreu de duas formas bem distintas, mas no fundo com o mesmo intuito proposital, muitas iam de livre e espontaneamente vontade, eram no geral mulheres que provinham da classe operárias, e algumas eram supostamente raptadas, o que nos faz colocar em causa a situação do “rapto consentido”, que trazia com isso o rompimento dos dogmas impostos pelas famílias opressoras, que sempre as indagavam com propostas de casamentos indesejáveis, e a legitimação de uma vida sem perspectiva de progressão, ou seja a inclusão das mulheres ao Cangaço era na época algo muito atual nos dias de hoje, a luta constante da desconstrução da figura feminina estereotipada perante a sociedade, elas foram capazes de erguer forças e fazer com que as pessoas as  enxergassem como seres humanos, e não como peças de decoração dominadas pelas oligarquias estatais.

Dentro do Cangaço, elas encontraram uma liberdade de expressão muito almejada, um grande exemplo foram as Cangaceiras Dadá e Sila, que dentro do movimento tiveram a oportunidade de aprender a ler e escrever, com seus companheiros.

Todas sabiam atirar, por uma questão de defesa pessoal, todas portavam armas de fogo, e o punhal de prata, era o instrumento principal para identificar se os mantimentos haviam sido envenenados.

Cangaço significa pioneirismo, elas não foram para ser domésticas, elas entraram para um grupo revolucionário, vieram antes de nós e precursoras dos direitos femininos, hoje são exemplos de história de resiliência, e resistência.

Este texto é dedicado á todas Marias Bonitas, todas Sandinhas, todas Dilias, todas Valentinas, todas mulheres que sairam das periferias opressoras da vida, e se tornaram autoras da sua própria história.

Sobre Carolina Tsukishiro

Carolina, atuante na área da educação. Encontrou sua identidade, através do punk que foi o instrumento principal de sua ligação com a cultura Hip-Hop. Filha do mundo, e sobrevivente do caos urbano. Zona Leste, 011.
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